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quarta-feira, 30 de julho de 2014

Domingos de missa

Quando era miúda achava que a missa era uma coisa chata e demorada sem sentido. As velhas beatas cantavam mal e cheiravam a mofo. Na altura não percebia bem mas aquele momento da semana era quando todas as pessoas da aldeia se juntavam. Os maridos iam ao "Armando" e faziam a barba. Por vezes aparavam o cabelo, vestiam a roupa de domingo, dirigiam-se para a porta da igreja mais cedo e ficavam à conversa. Falavam das colheitas, do jogo do Desportivo e reparavam nas raparigas novinhas.

As mulheres preparavam tudo de maneira a que quando chegassem da missa estivesse tudo pronto e se pudesse almoçar. Mesa posta, assado no forno de lenha, colar de pérolas e brincos postos, tiravam o avental e iam para a missa em passo acelerado.

Sentavam-se sempre no mesmo lugar como se os lugares estivessem marcados. Eu chegava sempre tarde à missa porque vinha da cidade com os meus pais e com a minha irmã. Antes de entrar na igreja a minha mãe arranjava-nos sempre os cabelos e os vestidos enquanto resmungava:

-Olha pra isto! És sempre a mesma coisa!

O meu pai fingia que tinha de ir estacionar o carro longe, raramente assistia à missa e ficava na conversa à porta da igreja com os amigos de infância, eu fingia que não percebia.

Dentro da igreja observava tudo, sabia onde estava cada pessoa. Procurava os meus Avôs com o olhar, eles estavam os dois sempre lá na frente ao pé do padre um deles era o sacristão e estava atento aos pormenores da celebração, ajudava em alguns rituais e fazia-me sinal para eu fazer a leitura. O outro tirava sempre o chapéu, parecia sempre muito atento, era careca e eu achava graça ao reflexo da luz na careca. Brilhava mesmo! Tinha uma opima postura, sempre muito direito, tinha sido militar e isso notava-se. Costas direitas, mãos atrás das costas, posição de descansar à vontade.

As minhas Avós estavam com as suas toaletes de Domingo, roupas que eu achava um pouco "demode" com uns padrões estranhos e as vezes até tinham golas de renda. Mulheres habituadas a poupar e que apesar de terem algum dinheiro mantinham os padrões baixos, hoje percebo isso.

Para mim a cerimônia dividia-se em 3 momentos: os beijinhos, as moedinhas e a Hóstia. Às vezes tinha que levar com as leituras, principalmente em épocas festivas. Era um orgulho para os meus Avós, a ‘piquena’ deles estava a ler para toda a gente.

Estava sempre desejosa de ouvir o Padre que eu meu primo e afilhado da minha Avó paterna dizer ‘Ide em paz e que o Senhor vos acompanhe’. Era música para os meus ouvidos, depois dessas palavras corríamos para casa. Eu ajudava a minha Avó no que ela precisasse, basicamente em nada porque ela tinha sempre tudo controlado. A minha Mãe era sempre a responsável por levar a sobremesa. Comíamos como abades, tudo sabia diferente e muito melhor. No final do dia quando chegava a casa estava sempre exausta, mas desejosa do próximo Domingo. Fui uma criança com uma infância cheia de momentos felizes e principalmente com uns Avós fantásticos.

  

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